Ao tomar este
romance de Mario Vargas Llosa, prepare-se para deliciosos momentos de diversão.
O Peruano vencedor do Nobel de Literatura nos presenteia com seu “Pantaleon
Pantoja”, oficial do exército de formação rígida e comedida, a quem é dada a
ingrata tarefa de reduzir os casos de assédio sexual promovidos pelos
combatentes em postos distantes na Floresta Amazônica. A solução implantada com
urgência: criar uma divisão oculta, formada por prostitutas dedicadas a visitar
os soldados periodicamente e atender-lhes às necessidades animais.
“ – Já aconteceram casos de
pederastia e até de bestialidade – explica o Coronel Lopez Lopez, - Imagine que
um cabo de Horcones foi surpreendido fazendo vida de casado com uma macaca.
- A macaca atende ao absurdo apelido de
Mamadeira da Quinta Quadra – contém o riso o Alferes Santana. – Ou antes,
atendia, porque a matei com uma bala. O degenerado está na prisão, meu
coronel.”
O livro se
desenvolve num interessante artifício do autor. Não toma para si a voz de um
observador externo, ou os pensamentos de um dos personagens para contar sua
história. Ao contrário, lança mão de uma sequência de cartas e relatórios com
linguagem objetiva/militar sobre as conclusões e decisões do Capitão Pantoja
acerca de sua missão.
“Que entre a matizada gama
de prestações proporcionadas figuram a simples masturbação efetuada pela
meretriz (manual: 50 soles; bucal ou “corneta”: 200); até o ato sodomita (em
termos vulgares ´polvo estreito´ ou ´com cocozinho´: 250), o 69 (200 soles),
espetáculo sáfico ou ´tortillas´ (200 soles c/u), ou casos menos frequentes que
exigem dar ou receber açoites, vestir ou ver disfarces e ser adorados,
humilhados e até defecados, extravagancias cujas tarifas oscilam entre 300 e
600 soles.”
O autor faz uso
inteligente de várias tensões, e as explora com senso de humor. Os militares se
debatem entre as aparências de uma organização séria de defesa, e o serviço que
colocaram em funcionamento. Há a clandestinidade, mas também a necessidade de
controle e prestação de contas. Llosa faz piada da hipocrisia da fidelidade
conjugal e da moral das beatas. O povo luta entre o exercício da religião
oficial e a vivência visceral de uma seita com sacrifícios de animais. A
imprensa local se divide entre a compaixão pelo sofrimento das prostitutas, e a
condenação dos atos “imorais”. Enquanto as diferentes interpretações desfilam
no livro de Llosa, há o pragmatismo do general em Lima:
“Tigre Collazos ri a
gargalhadas: ´é preciso encarar as realidades e chamar ao pão pão vinho vinho:
os soldados precisam foder e você lhes consegue com quem ou o fuzilaremos a
canhonaços de sêmen”
Llosa me causou
a mesma impressão que Gabriel Garcia Marquez, de que há uma irmandade ainda a
ser explorada entre nossos hábitos e o de nossos vizinhos de língua hispânica. Faz
também lembrar Jorge Amado quando este descrevia uma Bahia de instintos
aflorados, de temperos e sabores, de calores e suores, de natureza indomada e
de excessos de toda ordem – mas sem as chatices de seus trechos panfletários.
Sob a influência
do clima quente e úmido, e uma inocência paradisíaca expõe nossos instintos
mais belos e os mais cruéis. Ao fundo de páginas jocosas, um estudo de
antropologia: vivemos como nas primeiras
civilizações humanas, fazendo lutar nossos instintos com nossas regras. Aos de
cabeça aberta, dispostos à linguagem despudorada, um ótimo livro.
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