Uma história de herói, em que o protagonista
sai de sua posição de conforto, aventura-se no desconhecido e sai aperfeiçoado
desta experiência. Uma história jornalística, em que o cenário denuncia uma
condição política, uma injustiça, um crime. Uma história romântica, em que após
desencontros um casal se encontra e se ama para sempre, ou se mata por não
consegui-lo. Uma saga de família, com seus altos e baixos. Encontre tantos
outros roteiros. Hoje em dia, é difícil ser um autor original.
Na busca por uma obra genuinamente nova, vários
autores propõem experiências. Que tal escrever sem pontuação? Sem final? Com
final alternativo? Que tal embaralhar os capítulos? Quebrar expectativas do
leitor? Mas parece que essas fórmulas agradam menos aos leitores. Nossos clássicos
e best-sellers ainda são derivados das velhas fórmulas.
Antonio Tabucchi tenta uma novidade em “Noturno
Indiano”. Apenas um homem viajando por hotéis da Índia. O Homem procura outro
(Xavier), razão frágil de suas andanças. Sem pressa, sem vida antes ou depois,
absorve o entorno de maneira contemplativa, neutra. Fica embriagado por vezes,
mas prescinde desse recurso para parecer destacado da realidade. Inebria-se
ainda dos detalhes, das pessoas que conhece, das vaidades que confronta e
apresenta. Quem já leu “O Apanhador no Campo de Centeio” ou “On the Road”,
talvez tenha até se afeiçoado a esta estética. Uma escrita descritiva,
saborosa, mas que abre mão de um destino, de um propósito. Não por acaso, esses
exemplos também se passam em viagens, em locais transitórios.
Sofia Copolla também explorou esta
transitoriedade, fazendo seus filmes se passarem em hotéis. Hotéis são
agradáveis, mas impessoais. Te compelem a uma situação transitória. Você está
ali apenas temporariamente. São cenários, mas para situações reais. Aquilo é
sua vida, mas ao mesmo tempo não é. E para onde levarão as viagens e as
experiências acumuladas? Não importa. Decida você, leitor, o nem se dê ao
trabalho. Você carrega suas experiências consigo, como páginas lidas.
Da mesma forma, Tabucchi parece não se importar.
Quer apenas que suas páginas sejam lidas, e façam parte de nossa experiência.
Não precisam levar a lugar algum:
“Só nesse momento
percebi que era louco. Percebi (...), e tudo isso não me espantou: provocou-me
só uma indiferença cansada, como se tudo fosse necessário e inelutável.”
Ah! Em tempo, o Xavier, que o personagem
principal procura é nada menos que...bem, não serei “spoiler”, mas me
surpreendeu. Deixei você curioso(a), certo? "Necessário e Inelutável"...
“ – Quem pode saber? –
eu disse - , é difícil, isso nem eu que escrevo o livro sei. Talvez procure um
passado, uma resposta para alguma coisa. Talvez queira agarrar algo que tempos
atrás deixou escapar. De qualquer modo, está à procura de si mesmo. Quero dizer
que é como se procurasse a si mesmo procurando-me: nos livros acontece muitas
vezes assim, é literatura.”
Empilhei todos os livros que li. Do alto desse
modesto montinho, não consegui enxergar a qualidade tão premiada de Antonio
Tabucchi. Ao menos não em “Noturno Indiano”.